Ler Pessoa, sempre!
Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, in "Mensagem"
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Quando realmente se quer e acredita, não existe barreiras para nos impedir de lutar naquilo que acreditamos...
ESTOU CANSADO
Estou cansado, é claro,
Porque, a certa altura, a gente tem que estar cansado.
De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.
Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto —
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma transparência lúcida
Do entendimento retrospectivo...
E a luxúria única de não ter já esperanças?
Sou inteligente; eis tudo.
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.
Álvaro de Campos
Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São mijadelas de Portugal!
Por te mijarmos, quantas pesssoas em ti se aliviaram,
Quantos olhares no infinito se fitaram!
Quantas bexigas ficaram por despejar
por ser feio mijar no mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a tarde está serena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que dar ai mar um pouco do seu fedor.
Deus ao mar a água e o mijo deu,
Mas nele eu espalho o meu.
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